Como os músculos obtêm energia para trabalhar?
O combustível dos músculos é uma substância chamada Adenosina Tri-Fosfato, o ATP. As moléculas de ATP se quebram, gerando Adenosina Di-Fosfato (ADP) e Energia livre, a qual é diretamente utilizada pelos músculos para produzir trabalho. A reação é anotada assim:
- ATP ----> ADP + Energia
- FC + ADP ----> ATP + Creatina
Se o trabalho continua depois do esgotamento do FC, um segundo processo entra em funcionamento para a reposição do ATP. Este processo utiliza os depósitos de glicose e gordura do nosso corpo (os estoques de glicose são gastos primeiro, depois os de gordura). Para a glicose, ele ocorre em duas fases, como mostrado abaixo:
- (1): Glicose + ADP ----> ATP + Lactato
(2): Lactato + O2 + ADP ----> ATP + CO2 + Água
Fonte: Vide referências [1]
A partir de um certo nível de lactato, o atleta se vê simplesmente obrigado a diminuir a intensidade ou mesmo a interromper o exercício. Além disso, treinos seguidos na faixa do sistema anaeróbico-láctico causam o enfraquecimento do sistema imunológico.
Quais as características do TM?
O TM de mesa se caracteriza por curtos intervalos muito intensos de troca de bola intercalados por períodos de relativo repouso. Nas trocas de bola o trabalho muscular é quasi-máximo (no alto nível pelo menos), com altíssima exigência da coordenação. Durante uma partida, que pode durar entre 20 e 60 minutos, a frequência cardíaca média fica em torno de 140 a 150 batimentos por segundo.
Com toda evidência, o sistema mais importante para o TM é o anaeróbico-aláctico, secundado pelo sistema aeróbico.
No sistema anaeróbico-láctico, o lactato se acumula nos músculos causando:
- a) hiperacidez (dores musculares),
b) a perda de coordenação,
c) aumento do tempo de reposição do Fosfato de Creatina.
d) diminuição da capacidade imunológica
Já o condicionamento aeróbico tem a vantagem adicional de deslocar a curva de lactato para a direita. O gráfico baixo mostra novamente a concentração de lactato como uma função da intensidade de trabalho (frequência cardíaca). A curva da esquerda pertence a uma pessoa destreinada, a curva da direita a uma pessoa treinada. Uma pessoa treinada suporta uma maior intensidade de exercício sem entrar na faixa anaeróbica.
Fonte: Vide referências [1]
Como se treina o sistema anaeróbico-aláctico?
O condicionamento do sistema anaeróbico-aláctico implica não só no aumento dos estoques de ATP e FC presentes nas células musculares, mas também na diminuição do tempo de reposição.
- melhor concionamento anaeróbico-aláctico = maior estoque de ATP e FC + menor tempo de reposição do estoque
Fonte: Vide referências [1]
No caso específico do TM, o condicionamento do sistema anaeróbico-aláctico é feito preferencialmente com o método de multi-bolas, mas também é possível nos treinamentos táticos. Em ambos os casos, utilizam-se exercícios com bastante footworking, executados em intensidade máxima ou sub-máxima (80%).
Com intensidade máxima, a duração de cada exercício é de no máximo 12 segundos. Com intensidade sub-máxima, a duração de cada exercício é de 20 a 30 segundos. Entre cada exercício, deve-se ter 1 a 2 minutos de intervalo. Após uma série de 4 exercícios, faz-se um intervalo maior, de 3 a 5 minutos. O número de séries depende do condicionamento geral de cada indivíduo e do plano geral de treinamento.
Note: o treinamento com multi-bolas em intensidade máxima mata dois coelhos com uma cajadada só. Ao mesmo tempo em que se treina o sistema anaeróbico-aláctico, treina-se a coordenação necessária para a transformação da força muscular bruta (obtida em treinamentos específicos de força, vide em referências [2]) em velocidade de jogo.
Como se treina o sistema aeróbico?
Quanto melhor o condicionamento aeróbico, mais rápida é a reposição de ATP e FC, e maior é a intensidade de trabalho que se pode realizar antes de se ultrapassar o limiar anaeróbico.
A intensidade ideal de treinamento aeróbico pode ser estimada pelo método da “Frequência Cardíaca de Reserva” (Freq_reserva), desenvolvido pelo finlandês Karvone. A Freq_reserva é a diferença entre a frequência cardíaca máxima (Freq_maxima) e a frequência cardíaca em repouso (Freq_repouso):
- Freq_reserva = Freq_maxima - Freq_repouso
- Freq_maxima = 220 - Idade
- Freq_treino = Freq_repouso + (0,7 x Freq_reserva)
- Freq_reserva = 220 - 20 - 65 = 135 bat/min
Freq_treino = 65 + (0,7 x 135) = 65 + 95 = 160 batimentos/minuto
Portanto, o uso desses relógios que controlam os batimentos cardíacos (por ex. da marca Polar) é de grande ajuda no treinamento aeróbico. O modo de treinamento em si pode incluir corrida, ciclismo, natação, patinação, etc., embora o mais adequado para o TM seja mesmo a corrida.
O treinamento aeróbico deve ser extensivo. Para um jogador de TM ele deve durar entre 45 a 60 minutos (dependendo do condicionamento individual), na intensidade indicada acima (Freq_treino), sem pausas.
Quando se iniciar um programa de treinamento aeróbico específico para o TM do zero, deve-se contar com um período de 8 semanas até se atingir o condicionamento ideal (que para o mesatenista não é o condicionamento máximo). Estas 8 semanas devem se encaixar entre a pré-temporada e o início da temporada. Neste período, treina-se a parte aeróbica no ritmo 3 por 1, isto é: treina-se 3 dias seguidos (uma corrida por dia) e descansa-se 1. Após este período de preparação, dedica-se mais tempo a treinamentos técnico-táticos e jogos, mas mantém-se uma corrida por semana, de manutenção. Nos intervalos da temporada em que se tem menos competições, pode-se fazer uma ou duas séries de 3 por 1, conforme a oportunidade.
Obs.: neste período pré-temporada também deve-se colocar mais ênfase no treinamento de força.
Uma palavrinha sobre nutrição
O sistema aeróbico repõe o ATP usando os estoques de glicose e gordura do nosso corpo. A reposição a partir de glicose é mais rápida, e portanto mais importante para o TM. O problema é que o estoque de glicose também é limitado, sendo suficiente para 60 a 90 minutos de atividade (90 min em alguém muito bem treinado), conforme se vê na figura baixo:
Fonte: Vide referências [1]
A glicose è reposta através da ingestão de carbohidratos. Portanto, é de fundamental importância a ingestão destes nutrientes entre cada partida em campeonatos e a cada hora de treino. Eu, por exemplo, consumo estas barras de cereais direto, com muita água. A água é necessária para a fixação dos estoques de glicose no fígado (na forma de glicogênio). Banana também é excelente, pois além de ser uma fonte de carbohidratos e sais minerias importantes é rica em fibras, as quais ajudam a evitar diarréia nos dias de jogos.
Conclusão
Para finalizar, é óbvio que o assunto não se esgota nestas linhas. Aqui está um resumo da prática que eu adoto, junto com a teoria com a qual eu justifico esta prática prá mim mesmo. Esta prática foi desenvolvida com base em conversas com colegas e treinadores, nas leituras que eu fiz e nos resultados que eu obtive aplicando as idéias que me pareceram mais corretas. Muita teoria e vários métodos alternativos foram omitidos.
Referências
[1] Título: Konditionstraining im Tischtennis. Autor: Wolfgang Friedrich. Editor: Deutscher Tischtennis-Bund, 2005.
[2] https://mesatenista.net/modules.php?name=Forums&file=viewtopic&t=5461&sid=0e89b2dd6d8b1fbc558204dae221357a