Extraído do site: www.bty.com.br
[b]Entrevistamos Marcos Yamada, figura renomada no cenário do Tênis de Mesa nacional.
Na entrevista Marcos fala de suas experiências, discute as mudanças das regras do Tênis de Mesa entre outros.[/b]
- Vc que conhece basicamente todas as escolas de TM do mundo, qual a maior deficiência dos atletas brasileiros e a maior qualidade?
Marcos : Tive a oportunidade de ir a todos os campeonatos mundiais desde 1991 e na minha opinião a maior deficiência é a preparação das pernas. O Tênis de Mesa exige muita movimentação, pois a bola nunca vem no mesmo lugar. Em especial no alto nível onde a velocidade é maior, o grau de dificuldade para rebater é maior ainda; portanto, o atleta tem que estar sempre bem equilibrado para não falhar. O praticante que tem boas pernas e se movimenta adequadamente, consegue chegar mais rápido sem gastar muita energia, conseqüentemente obtém sucesso no golpe.
As maiores qualidades, eu diria que são : a habilidade e a versatilidade. Mesmo sem ter uma técnica perfeita o atleta brasileiro cresce ao enfrentar jogadores fortes nos campeonatos.O Biriba criou um estilo próprio de jogar, não teve a chance de treinar no exterior, com diferentes escolas, não tinha muitas informações, mas se superava ao jogar, vide os grandes resultados que ele obteve.
- Se hoje temos um grande conhecimento técnico, e facilidades para viajarmos para o exterior, por que o Brasil não consegue atingir o nível de top mundial?
Marcos :Segundo a ITTF, no masculino em 1954, ficamos em 4o lugar, 1959 em 6o lugar, 1989 em 19o lugar e atualmente somos 39o. Depois que criaram as divisões (o Brasil foi campeão mundial de equipes da 3a divisão em 1983), nós nunca conseguimos chegar a 1a divisão que antes era formada por apenas 16 países e agora são 24. Nos anos 50 e 60, tínhamos Betinho, Biriba, Hugo e Ivan Severo. Na década de 80 e 90, Kano, Hoyama, Inokushi e Kawai; portanto para atingir um nível muito forte, precisamos de um GRUPO querendo chegar lá. Pessoas que abdiquem de tudo e passem a almoçar e jantar Tênis de Mesa.
Estou a 31 anos, ininterruptos, na modalidade e o melhor modelo que vi até agora, foi a da figura de um líder que conquistou credibilidade junto aos seus atletas, Maurício Kobayashi: era o primeiro a chegar, último a sair, nunca faltava a um treino, era duro e com critérios justos, não se preocupava com nada além de Tênis de Mesa. Estudava e planejava passo a passo a carreira de seu GRUPO.
Eu acredito que condições e estrutura nós temos no Brasil, mas falta um GRUPO trabalhando forte com muita MOTIVAÇÃO, espírito de equipe e um líder com CREDIBILIDADE. Conhecimento técnico? Ainda temos muito que aprender.
Que tal fazermos como na China, criarmos a seleção A e B com 15 a 20 atletas e colocá-los juntos durante um longo período, para criar este espírito de 1a divisão?
- Vc acha bom o surgimento de tantas Ligas Regionais, e ainda agora uma Liga Nacional?
Marcos :Eu faço uma analogia com o nosso futebol e futsal. Existem milhões de praticantes de futebol no Brasil: prédios, ruas, clubes, praças, parques, praias, colégios, etc; todos ainda despreparados para o futebol profissional, mas a partir do momento que cada órgão desse começar a organizar algumas competições, criar critérios para identificar o jogador de talento, premiá-lo com um estágio ou uma competição oficial, fatalmente ele virá às Federações, para que seja reconhecido. Sem as Ligas, perderemos uma grande chance de formar e descobrir atletas com chances de representar bem o Brasil no exterior.
O atleta de talento para o esporte, raramente vem para a nossa modalidade, visto que existem outras mais atraentes no que se refere ao retorno financeiro e da mídia. Por isto a nossa função é de ir buscá-lo, ou seja, fazer com que goste, participando inicialmente nos Torneios das Ligas e de não federados.
- Vc tem algum projeto ou algum sonho que pretende realizar ainda para o Tênis de Mesa brasileiro?
Marcos :Claro, muitos como: Já visitei inúmeras cidades brasileiras (em 21 estados do país), ensinando TM, e duas me chamaram atenção; Manaus e Marília. Caminhando pela cidade, escuto e vejo o “ping” e “pong”, tradicional barulho da nossa modalidade.
Mesas armadas nas ruas de Manaus ? ao invés de “pelada de futebol” , vejo o “TM ao ar livre”; já em Marília, vi nas escolas de inglês, varanda, quintais a mesinha montada e filas de crianças para praticar TM. Este é o sonho que mais gostaria de ver realizado, o esporte muito popular, como os antigos Torneios da Gazeta onde juntavam de 3.000 a 5.000 participantes, Biriba e Betinho jogando em ginásios lotados, 8.000 clubes de TM no país, etc. É bom sonhar…
- Como já sabemos, vc é o representante da maior marca de tênis de mesa do mundo, aqui no Brasil, a Butterfly. É difícil fabricarmos aqui no Brasil material da qualidade da Butterfly?
Marcos :A parte comercial veio há pouco tempo em 1992, depois de 21 anos na modalidade, surgiu esta oportunidade, abdiquei a minha carreira de engenheiro para ficar só com o tênis de mesa.
A Butterfly no Japão possui uma fábrica com muitos empregados em relação aos demais e tem engenheiros especializados; ela é dividida em grupos de pesquisa e desenvolvimento, utilizam máquinas caríssimas e já está a 50 anos estudando os processos de industrialização. Eu acho muito difícil fabricarmos aqui, pois trabalhamos com um esporte onde a precisão nos golpes, depende muito de um bom material. Países mais desenvolvidos que o Brasil, também estão tentando mas …não é fácil competir com os produtos Made in Japan. O Japão se tornou a 2a economia do mundo, não foi por acaso e sim por trabalhar honestamente e manter a qualidade dos seus produtos em todo o mundo. O faturamento da Butterfly é quase o triplo da empresa que número dois no mundo.
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A Butterfly do Brasil, patrocina algum atleta brasileiro? O que é preciso para conseguir um patrocínio da Butterfly?
Marcos :Sim, patrocina vários em conjunto com a Butterfly do Japão. Existem dois grupos de atletas patrocinados: Os já consagrados e os especiais, que chamamos de atletas do futuro. Na revista TT player edição de abril 2002, saiu uma lista com alguns deles. Basta treinar forte, ter bons resultados, como participar da seleção brasileira, e ter boa conduta. Os que treinaram no Centro de Treinamento da Butterfly (DOHJO) no Japão, já estão a um passo de consegui-lo. -
As mudanças das regras que vem ocorrendo no tênis de mesa (bola de 40 mm, sets de 11 pontos e agora o saque), vc acha benéfica para a evolução do esporte?
Marcos :Eu acho que o aumento da bola e o pedido de tempo foram excelentes mudanças, as partidas ficaram mais atraentes e até tem o tempo para o patrocinador na TV, porém nas demais alterações, tenho algumas dúvidas. No caso dos 11 pontos o tênis de mesa perdeu um pouco de sua identidade; como por exemplo, porque o futebol é tão tradicional ? Nas peladas você inventa as regras, “15 min por 15 min”, “quem fizer dois gols vence”, etc. No futebol oficial não, são “45min por 45 min”, “dois tempos”, “impedimento”, “lateral com as mãos”, “escanteio com os pés”, etc. Todos conhecem a regra, é mundial, sendo muito difícil alterá-la, criando-se uma cultura de anos. Portanto no pingue-pongue, “família”, “três queimadas no saque”, “quem fizer o ponto fica com o saque”… é similar a uma “pelada”. Quando falávamos de TM, “21 pontos’’, “cinco saques para cada”, jogo oficial que muitos conheciam. Hoje ninguém sabe mais se são “três saques”, “melhor de 7”, etc. Quanto à regra do serviço é boa para que se tenha mais “rally”, mas e para o árbitro visualizar ? E a padronização ?
Resumindo eu concordo com mudanças, mas não todas de uma vez, como vem sendo implantadas. Deveria existir um tempo maior de adaptação para não perder a sua identidade, como em muitos esportes os quais não sabemos se agora são dois tempos ou três tempos, 15 ou 25 pontos, etc.
- Como vc vê a dificuldade das crianças brasileiras em conciliar os estudos com os treinamentos? É possível? Pq. a maioria pára de treinar, quando está atingindo um bom nível?
Marcosesporte é um excelente veículo para ensinar as crianças a ter disciplina, aproveitar e administrar melhor o tempo, tirar o tempo ocioso do adolescente para que não vá em busca de novas sensações como a droga, bebida e o fumo. Portanto cabe ao treinador educá-los e dar o exemplo a eles de quanto é importante a escola, aprender, ensina-lo a tirar o seu diploma universitário e saber se dividir entre os treinamentos e os estudos.
Até a categoria juvenil, o atleta treina bastante e chega a atingir um bom nível, mas na época de entrar na faculdade, ele terá que optar pelo seu futuro na modalidade ou num bom emprego para sobreviver. Nos países mais desenvolvidos os atletas conseguem ingressar numa boa Universidade de duas maneiras: pelo esporte ou pelo nível de conhecimento, aliado ao oferecimento de bolsas de estudo.
Ao sair da Universidade, ocorre o mesmo, ele consegue emprego pela capacidade ou para representar a empresa nos campeonatos, assim fica fácil decidir, parar ou não de treinar.
- Fale-nos um pouco de sua trajetória. Pq. Tênis de Mesa?
Marcos :Comecei um pouco tarde na modalidade (infantil), mas com muito esforço e dedicação consegui alguns bons resultados no juvenil, também pudera, treinando 10 horas diariamente. Como disse na pergunta anterior, no 3o colegial tive que optar e fui ser engenheiro. Porém nunca abandonei o TM, sempre como técnico desde os 17 anos, foi um meio de conseguir o meu sustento. Atuava em clubes pequenos e em 1986 veio o grande desafio da Dna Minako Takahashi; ela que já tinha treinado comigo em vários clubes, já havia me convidado três vezes para ser o treinador do Itaim Keiko e com uma proposta salarial incrível, fui o técnico que, com cartas brancas, pude trabalhar livremente, estruturando toda a parte técnica.
Na foto o Presidente da Federação Paraguaya de Tênis de Mesa, Sr. Mieres e Marcos Yamada em curso da ITTF.
Como conseqüência dos trabalhos que pude desenvolver, vieram os convites da Federação Universitária (FUPE), Confederação Universitária (CBDU), Comissão Intercolonial, Federação Paulista de TM (FPTM), ESPN-Brasil, Itaim Keiko, Nippon CC, Clube Piratininga, ACESantana, Comissão Panamericana Nikkey, Vibração Nestlé, etc.
Mas acredito que temos muito ainda para fazer pelo tênis de mesa.
- Deixar a engenharia para viver para o tênis de mesa. Como foi essa decisão? Vc se arrepende? Deixe-nos uma lição.
Marcos :Muito complicada na época, pois trocaria o incerto pelo certo e eu já era casado com uma filha. O grande segredo é acreditar naquilo que faz, jogar limpo, ter uma boa família que te dê apoio, educação e ensinar a ter respeito, faz com que tenhamos boas raízes e uma boa formação. A Dona Minako do Itaim Keiko, tem uma grande influência nesta minha decisão.
Fazer o que gosta, pode não render financeiramente, mas com certeza fará o seu dia a dia melhor, você não verá a hora passar e tornará a segunda-feira um dia excelente. Eu não tenho preguiça para trabalhar em prol do esporte e conviver com crianças, educá-las, dar exemplos como: o de não fumar, beber, drogar e de como tirar um diploma universitário, isto faz com que muitos garotos te sigam e mudem seus costumes para melhor.
A palavra mágica? Ajudar!
Marcos Yamada